sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Luto por acidentes rodoviários


Na vida quer queiramos, quer não, estamos sempre a lidar com perdas. Perdas estas que têm diversos graus de intensidade, sendo que, umas são mais dolorosas e significativas, que outras, visto que representam uma grande ausência para nós.
Todavia, no percurso de vida de cada um de nós o confronto com o sofrimento é parte integrante da nossa existência. Todos nós, num ou noutro momento da nossa vida, vemo-nos confrontados com determinadas situações que interferem com a globalidade do nosso ser. Desta forma, diariamente é frequente escutarmos alusões ao sofrimento, à morte e ao luto, quer através do nosso contacto diário com outras pessoas, quer através dos meios de comunicação social.
A morte ainda é um assunto ignorado e negado pela nossa sociedade. Mas a verdade é que esta é inevitável. É uma das poucas coisas na vida para a qual temos a certeza que vai acontecer. Esta é parte integrante da nossa vida e dá significado à existência humana.
Contudo, são vários os acontecimentos que podem antecipar o nosso confronto directo com a morte, sendo um deles, os acidentes rodoviários. Perante a perda de alguém próximo que tanto amamos, à qual nos sentimos profundamente vinculados, por acidente rodoviário, entramos num processo denominado por luto. Processo este que será tanto mais difícil quanto maior for o nosso grau de vinculação com a (s) pessoa (s) falecida (s).
Não existem palavras para descrever o sentimento de impotência, o não saber o que fazer. Muitos familiares sentem-se responsáveis pela morte dos seus ente-queridos, outros culpam toda a gente pelo sucedido. As interrogações emergem a uma velocidade espantosa. Porque é que estou a passar por isto? Porquê tão cedo? Que significado tem este acontecimento na minha vida? Mas…a maioria das pessoas não encontra respostas para tanta dor e sofrimento.
A vivência do luto é, por vezes acompanhada por comportamentos de agressividade e de revolta. Inicialmente agredimos os amigos e familiares com quem temos maior proximidade. Posteriormente, passamos a ter sentimentos de fuga, culpa e isolamento. E um impulso de revolta por um Deus que permanece distante e pela sociedade. Ou seja, amargurados pelo facto de não existirem respostas para a morte do nosso ente-querido, explodimos a nossa revolta contra o automobilista que vitimou familiar, pelos bombeiros, polícia, INEM e por aí adiante. [1]
Contudo, muitas das vezes o facto das pessoas terem sofrido uma perda inesperada, o assistirem a situações de mortes traumáticas, o sentimento de responsabilidade pela morte do ente-querido podem fazer com que um luto normal se transforme num luto patológico.
É aqui que entram os grupos de entre-ajuda, que na maioria das situações constituem a “tábua de salvação” para os familiares enlutados. Este tipo de grupos fazem ver às pessoas que os frequentam, que todos vivenciam os mesmos momentos de revolta, angústia, agressividade, ciúme, medo e que não caminham sozinhas, havendo sempre uma mão estendida pronta a ajudá-los.
Um grupo de entre-ajuda é um conjunto de pessoas com os mesmos problemas que se reúnem partilhando emoções e sentimentos, com o objectivo de tentar superar as suas dificuldades. Aqui cada um dos elementos serve como modelo de identificação perante os outros e os testemunhos prestados vão ajudar à caminhada do grupo no seu conjunto e cada um em particular. [2]
Contudo, devido ao elevado número de mortes todos os anos a nível mundial, provocadas por acidentes rodoviários foi adoptado pela ONU o Dia Mundial em Memória das Vítimas da Estrada, mais conhecido como DIA DA MEMÓRIA.
O Dia da Memória assinala-se todos os anos no terceiro Domingo do mês de Novembro. Um dia de luto por todos quantos perderam a vida nas estradas e que nesta data se recordam com carinho e a saudade incontornável de quem conheceu os que partiram, de quem convive com a ausência, de quem lida com as consequências de uma amputação prematura.
O luto não se trata com “pastilhinhas”, como por exemplo, o Xanax, é um estado da alma que se “cura”com muito amor, paciência, escuta e com esperança no amanhã.

Cristina Machado
(Psicóloga Clínica)

[1] Rebelo, J. E. (2007). Desatar o nó do luto. Lisboa: Casa das Letras.

[2] A Nossa Âncora

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